sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Ageu, o Profeta da Construção do Templo

I - História pessoal - Pouco se sabe a respeito de Ageu, além do fato de ter sido ele o primeiro profeta da recém-estabelecida colônia judaica, formada pelos  que regressaram da Babilônia à Palestina, em 536 a.C. Tanto em seu livro como em Esdras 5:1, ele é apresentado simplesmente como “Ageu, o profeta”. De Ageu 2:3 Ewald deduziu que ele já era um ancião, quando profetizou, tendo provavelmente entre 70 e 80 anos de idade. Em todo o caso, parece que tinha mais idade do que Zacarias, pois quando os seus nomes aparecem juntos, Ageu é sempre mencionado em primeiro lugar (Esdras 5:1;6:14). Uma tradição antiga declara com certeza que ele nasceu em Jerusalém, tendo sido levado cativo por Nabucodonosor, e que lhe foi permitido por Ciro o regresso à Cidade Santa. Por outro lado, Epifânio em sua “Vida dos Profetas”, afirma que ele voltou da Babilônia enquanto ainda era jovem.
         As versões gregas, latinas e siríacas associam o seu nome ao de Zacarias, no princípio de certos salmos, como o seu provável autor. Por exemplo, o Salmo 111 na Vulgata e os Salmos 125 e 126 na Peshita. O Salmo 137 na Septuaginta e na Peshita e o Salmo 245 na Septuaginta, na Peshita e na Vulgata. Contudo, alguns estudiosos acham provável que esses salmos fossem apenas apresentados nos serviços do Templo por recomendação desses profetas, que eram homens de grande fé (Comparar com Ageu 2:2-9). Ageu, especialmente, era um profeta cuja fé quase chegava à certeza (Ageu 1:13). Possivelmente ele também foi um sacerdote (Ageu 2:10-19). Segundo a tradição judaica ele era membro da Grande Sinagoga.
         Seu nome em Hebraico tem uma raiz descritiva de movimento excitado e rápido, tal como a dança. Daí se pode deduzir ter ele nascido em algum dia de festa. Compare-se com o nome romano “Festo”. Os nomes hebreus eram às vezes formados dessa maneira. Por exemplo, “Barzilai” significa “homem de ferro”, oriundo de “Barzil” = ferro. Por outro lado, é possível que o nome “Hagga” seja uma contração de “Haggiah”, significando “Festival de Javé” (1 Crônicas 6:30). Assim como “Matenai” é uma contração de “Mataniah” (Esdras 10:26,33). Também o seu nome pode ser uma contração de “Hagariah” (Javé se move), bem como “Zaqueu” é uma abreviação de Zacarias.
II - Sua Obra - A reedificação do Templo é o centro de interesse ao redor do qual gira tudo que Ageu prega. Porque sua missão suprema era animar os judeus de Jerusalém a se levantarem para reedificar o Templo de Salomão, destruído por Nabucodonosor em 586 a.C. Nenhum profeta pregou mais direta e fervorosamente aos seus contemporâneos e nenhum outro conseguiu mais êxito. Seu colega mais jovem, Zacarias, também foi chamado a ajudar nessa grande tarefa. A diferença entre eles é que Ageu pregou durante um breve período de crise, enquanto Zacarias anexou profecias espirituais de edificação, para todos os tempos, às suas visões sobre a reconstrução do Templo.
III - Seu período e circunstâncias - Todas as profecias de Ageu (bem como muitas de Ezequiel) estão datadas como pertencentes ao segundo ano de Dario, lá pelo ano 520 a.C. (Ageu 1:1,15;2:10). O livro de Esdras, sem dúvida, dá mais detalhes da história do seu período e obra (Esdras 1:1-4:5;4:24-6:15). Ele nos conta como um segundo êxodo, por assim, dizer, aconteceu em 536 a.C, quando Ciro, rei da Pérsia, deu aos judeus permissão para regressarem a Jerusalém (Ageu 1:1-4) e 42.360 pessoas, sob a liderança de Zorobabel, cabeça civil da comunidade, e Josué, cabeça eclesiástica, regressaram à Terra Santa e se estabeleceram em Jerusalém, e nas povoações vizinhas a Belém, Betel, Anatote, Gabaa e outras partes (Ageu Cap. 2).
         O livro de Esdras também nos diz como a permissão de Ciro para reconstruir o Templo transformou-se em letra morta durante anos (Ageu 4:1 e seguintes). Porque, ainda que os colonos judeus houvessem regressado da Babilônia ansiosos e entusiastas, a fim de restabelecer o culto no seu santuário, tendo edificado o altar dos holocaustos sobre o antigo local do mesmo (Ageu 3:2-3), sem dúvida sabemos que eles foram obrigados a desistir do seu término por causa dos ciúmes dos samaritanos semi-pagãos e meio judeus, os quais descendiam dos colonos trazidos a Samaria pelo rei Sargão, em 722 a.C (2 Reis 17:24-41), cuja oferta para ajudar na construção havia sido terminantemente recusada (Ageu 4:1-5,24 - Comparar com Ageu 5:16). Por causa disso, o trabalho de reconstrução ficou parado por dezesseis anos. A apatia substituiu o entusiasmo e o sórdido afã de ganhar dinheiro absorveu-lhes o interesse principal.
         De fato, parecia que, à medida em que o tempo passava, os judeus até começavam a regozijar-se com a oposição feita à sua tarefa, visto como isso lhes dava oportunidade de construir casas bem trabalhadas para eles mesmos (Ageu 1:4). Porém aconteceram anos de escassez, devido, como Ageu lhes recorda, ao desagrado de Javé (Ageu 1:1-11).
         O Prof. W. H. Kosters (de Leiden), por outro lado, procurou mostrar, há vários anos, que não houve tal regresso dos judeus do cativeiro, sob Ciro, e que Ageu e Zacarias nunca fazem alusão a este, mas até consideravam o regresso de Israel como coisa futura (Zacarias 2:6-7) e pregavam ao restante dos judeus que havia ficado em Jerusalém, depois de Nabucodonosor ter levado para o cativeiro a nata da nação, em 586 a.C.  Contudo, apesar da plausibilidade da teoria de Kosters, a narrativa contida em Esdras, Caps. 1-4, descrevendo o regresso de 42.360 judeus sob a direção de Zorobabel e Josué, merece ser crida como verdadeira. Kosters teve poucos discípulos.
         Quando Dario, filho de Histaspes, subiu ao trono, uma nova era foi inaugurada na história da novel colônia. Politicamente, esse era um período crítico. No ano 521 a.C., tendo Dario despachado o usurpador que ocupara o trono por sete meses, começou a reinar sobre o desunido império persa. Sua obra era essencialmente a de reconstrução política. Seus antecessores, Ciro e Cambises, haviam se ocupado principalmente de guerras de conquistas. Por isso haviam tido pouca oportunidade de consolidar as várias tribos que estavam nominalmente sujeitas ao governo persa. Muitas dessas tribos estavam descontentes e rebeldes. Insurreições eclodiam em toda parte do império, no início do reinado de Dario (Ageu 2:7,22). Rebelaram-se as províncias de Susana, Média, Assíria, Armênia e Partia, ao todo vinte e três, causando sérias preocupações ao rei. Compare-se a famosa Inscrição Behistun de Dario. Este lutou em dezenove batalhas, subjugando as tribos recalcitrantes. Mesmo assim, o império persa foi sacudido até os fundamentos, especialmente no ano durante o qual Ageu pregou (520 a.C.). Estes acontecimentos dão conta das repetidas alusões do profeta ao fato de que Javé iria fazer “tremer todas as nações”  (Ageu 2:6,7,21,22). Ele parece considerar esse abalo das nações como um prenúncio da era messiânica e a reedificação do Templo como a necessária preparação para a recepção do Rei Divino.
IV - Análise - As profecias de Ageu, por estarem datadas, são facilmente analisadas:
1. - Cap. 1:1-15 - Pronunciada no primeiro dia do sexto mês (setembro), contendo censuras do profeta à indiferença do povo em relação à Casa do Senhor, acusando-o fortemente, em o nome deste. Admoestando ainda por causa da apatia em relação à reedificação do Templo, o que havia feito com que Deus lhe negasse o produto do campo (Ageu 1:10, comparar com 2:16) e exortando-o a “considerar” os seus caminhos (Ageu 1:5-7). O efeito dessa admoestação aberta e comovente foi que, vinte e quatro dias depois, o povo começou a trabalhar (Ageu 1:14,15).
2. - Cap. 2:1-9 - pronunciada no vigésimo primeiro dia do sétimo mês (outubro) contém uma nota verdadeiramente animadora para aqueles, cujas ambições para construir o Templo (o qual seria digno de comparar-se ao de Salomão) corriam o perigo de fracassar. Ao contrário, o profeta lhes assegura que Javé “fará tremer” as nações e as coisas preciosas de todas as nações hão de vir, para aformosear e glorificar o novo edifício (Ageu 2:7-8, comparar com Hebreus 12:26-27).
3. - Capítulo 2:10-19 - pronunciada no vigésimo quarto dia do nono mês (dezembro), exatamente três meses após ter sido relembrada a obra de reconstrução do Templo, contendo o primeiro discurso, uma repreensão ao povo por causa da sua inação e a declaração de que o seu descuido nesse sentido havia contaminado a sua vida moral. Uma parte desse discurso é expressa em forma de parábola (Ageu 2:11,14), por meio da qual é demonstrado como uma só culpa pode conduzir ao vício. Por outro lado, se os trabalhos de reconstrução do Templo se adiantam, Javé voltará a abençoá-los e com boas recompensas há de premiar o seu zelo renovado (Ageu 2:19; Zacarias 8:9-12).
4. - Capítulo 2:20-23 - pronunciada na mesma data do terceiro discurso, anunciando que a catástrofe se avizinha, quando “o trono dos reinos” será transtornado, Zorobabel será estabelecido como o representante da dinastia de Davi, a esperança patriótica de Israel, o vice-regente honrado por Deus - sim, o precioso ”anel de selar” na mão de Javé (Comparar com Jeremias 22:24).
V - Lições permanentes - A mensagem de Ageu, com apenas 38 versos (que se imagina constituírem apenas um breve resumo dos mais importantes discursos do profeta), causou um ímpeto efetivo na causa da reconstrução do Templo, assim como testifica Esdras nos caps. 5:1 e 6:14 do seu livro. O resultado de sua pregação foi uma grande vitória. Porque persuadir todo o povo a fazer sacrifício financeiro e adiar os seus próprios interesses particulares, a fim de construir um santuário público, não era uma tarefa fácil. Porém Ageu o conseguiu e pelo seu êxito tornou-se o verdadeiro fundador do Judaísmo pós-cativeiro. Sua obra serviu de preparação à de Esdras e Neemias.
Entre as lições de Ageu, que são de valor permanente, destacam-se:
1. - A origem divina de toda pregação que tenha êxito - A declaração mais notável de todos os escritos de Ageu é a que se encontra em Ageu 1:13: “... Eu sou convosco, diz o SENHOR”. Repetidas vezes o profeta nos diz que “foi-lhe feita a revelação de Javé” (Ageu 2:1,10,20). Com muita freqüência ele usa também a expressão “Assim fala [ou diz] o Senhor do Exércitos” (Ageu 1:2,5,6,7; 2:11 – Comparar com Ageu 1:9; 2:7,9,23 e também com Ageu 2:4,14,17).
         Ele fala com freqüência da presença de Javé na nação: “...Eu sou convosco, diz o SENHOR”  “... porque eu sou convosco, diz o SENHOR dos Exércitos” (Ageu 1:13;2:4), prometendo da parte deste, por dez vezes, que ele fará coisas em prol de Israel: “Encherei esta Casa de glória”; “Darei a Paz”, “Transtornarei o trono dos reinos”, etc. Em verdade é por causa dessa convicção absoluta que Ageu se aventura a exortar o seu povo com “considerai os vossos caminhos” (Ageu 1:5 - Comparar com Ageu 2:15,18).
2. - O caráter contagioso do pecado da demora -  Com uma parábola um tanto inusitada - contida em Ageu 2:10-19 - o profeta ensina que mesmo não sendo a justiça contagiosa, a injustiça o é. “O apagado aroma de santidade exalado pelos sacrifícios do seu altar era demasiado débil para penetrar a atmosfera profana de sua vida”. Por outro lado, o grande adiamento de 16 anos na obra de reconstrução da Casa de Deus havia tornado o povo imundo à vista divina e lhe havia trazido o fungo, o granizo e a destruição, em vez da colheita abundante (Ageu 2:15-16). Ele argumenta que ainda que um homem saudável não possa comunicar saúde a outra pessoa, ao tocá-la, o enfermo pode facilmente comunicar contágio aos que o rodeiam. Em outras palavras, ele diz que há coisas mortas entre eles, isto é, o fato de que a Casa de Javé está deserta (Ageu 1:9;2:13,14) e que O tratando com indiferença, eles se tornaram imundos e contaminados.
3. - A igreja é o centro religioso do mundo – Ele diz: “E farei tremer todas as nações, e virão coisas preciosas de todas as nações, e encherei esta casa de glória, diz o SENHOR dos Exércitos. Minha é a prata, e meu é o ouro, disse o SENHOR dos Exércitos” (Ageu 2:7-8. Comparar com Isaías 2:2-4)). Assim o profeta atribui uma significação quase sacramental ao Templo (Comparar com Ezequiel, Caps. 40-48). Supõe-se que esse conceito não possa cumprir-se adequadamente, a não ser no sentido espiritual, conforme interpretado em Hebreus 12:26-28...
4. - A majestade  do reinado - A última promessa de Ageu é que Javé tomará Zorobabel e o converterá em um “anel de selar... porque te escolhi” (Ageu 2:23). Wellhausen e outros interpretam estas palavras sobre Zorobabel como significando ser ele o Messias esperado, prometido pelos profetas anteriores. Mas provavelmente basta pensar que o  profeta meramente o assinala como objeto das preciosas esperanças da nação. E que nas abaladas nações, ele, Zorobabel, o neto de Joaquim, que fora degradado das funções do ofício real (Jeremias 22:24), prosseguiria como o honrado vice-regente de Javé e assim uniria a esperança política da congregação posterior ao cativeiro à linha real das predições messiânicas de Judá. Isaías fala de Ciro em termos semelhantes, sem que haja qualquer implicação messiânica (Isaías 44:28; 45:1). Apesar disso, na proeminência que Ageu dá aqui ao Templo e a Zorobabel, temos a promessa de maior glória do segundo Templo por Jesus Cristo.
VI - Estilo - Ainda que o estilo de Ageu seja menos poético do que o dos seus predecessores, sem dúvida apenas se faz justiça ao falar dele como “áspero”, “mesquinho” e “pobre” em seu vocabulário. Porque o seu estilo convém admiravelmente à sua mensagem e ao fim proposto. Seu estilo, mesmo conciso e sem adornos, é, ao mesmo tempo, austero e forte. Suas afirmações são breves e agudas, exatamente o que a ocasião exigia para reformar, corrigir e restaurar. Ainda que o manto da profecia tenha caído sobre ele “em forma de andrajos e remendos”, não obstante suas palavras são as de um coração profundamente comovido por uma situação agitada. O seu propósito completa o que lhe falta em estilo. Mesmo usando um vocabulário limitado, repetindo com freqüência as mesmas fórmulas, Ageu é profundamente sério. Deve-se confessar que ele não carece de força, quando exorta, nem de emoção, quando repreende. “A magnitude profética de um poeta é medida, não pelo esplendor literário do seu estilo, mas pela obra que ele executa”.

The Tweve Minor Prophets”, George L. Robinson
Publicado por George H. Doran Co, New York, 1926
Traduzido por Mary Schultze, março/abril 2004
Citações bíblicas da Bíblia Revisada FIEL de Almeida

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