I - O Livro - Obadias é o livro
mais curto do Velho Testamento, tendo apenas 21 versículos. Não é citado
no Novo Testamento e neste não há referência alguma a Obadias, a não
ser que tomemos a idéia de que no verso 21 esteja refletida a idéia de
Apocalipse 11:15, versos que apresentamos a seguir: “E
subirão salvadores ao monte Sião, para julgarem o monte de Esaú; e o
reino será do SENHOR”... “E o sétimo anjo tocou a sua trombeta, e houve
no céu grandes vozes, que diziam: Os reinos do mundo vieram a ser de
nosso SENHOR e do seu Cristo, e ele reinará para todo o sempre”.
O livro aparece na escala dos
Doze, logo depois de Amós. Alguns se dão conta de sua posição aqui,
supondo que os organizadores do Cânon devem ter visto Obadias como uma
expansão da curta predição contra Edom, exposta em Amós 9:12. O título
descreve o livro como uma visão: “Visão
de Obadias: Assim diz o Senhor DEUS a respeito de Edom: Temos ouvido a
pregação do SENHOR, e foi enviado aos gentios um emissário, dizendo:
Levantai-vos, e levantemo-nos contra ela para a guerra”.
Esta foi chamada de “uma oração indignada”. Mesmo sendo breve, Obadias é
um livro difícil, com uma dificuldade nada proporcional ao seu tamanho.
II - O Autor - Obadias não tem uma
história pessoal. Sem dúvida o seu nome, cujo significado é “Adorador
de Javé”, é sugestivo. Esse era um nome muito comum entre os semitas,
especialmente após o cativeiro. Compare-se com Abdiel “Servo de Javé” (1
Crônicas 5:15) e com Abdala (nome árabe), que significa “Servo de
Deus”. Esforços têm sido feitos no sentido de identificar o profeta
Obadias com alguns outros homônimos, em número de doze ou mais, no Velho
Testamento, como por exemplo:
1. Obadias, o mordomo do palácio de
Acabe, o qual escondeu os profetas de Javé em duas covas - cinqüenta em
cada cova (1 Reis 18:3-6).
2. Obadias, o mestre da Lei enviado por Josafá entre as cidades de Judá (2 Crônicas 17:7).
3. O “homem de Deus” no tempo de Amazias,
o qual aconselhou o rei a não permitir que o exército de Israel do
Norte o acompanhasse na luta contra os edomitas (2 Crônicas 25:7).
4. Obadias, um dos superintendentes empregados no reparo do templo, sob o reinado de Josias (2 Crônicas 34:12).
Para o nosso profeta, sem dúvida, “sua obra era mais importante que o obreiro e por causa dessa obra ele permitiu que a sua personalidade fosse relegada ao fundo”.
III - A Mensagem - Toda a mensagem de Obadias pode ser resumida em duas frases: 1. A destruição de Edom (versos 1-16). 2.
A restauração de Israel (versos 17-21). Sem dúvida o profeta dirige
suas palavras, não tanto como uma admoestação a Edom, mas como uma
mensagem de consolo a Israel. O livro pode ser assim dividido:
1. A ruína de Edom, mesmo estando abrigada com segurança em meio às serras rochosas (Versos 1-9).
2. Os motivos, isto é, a sua crueldade com Israel e o seu regozijo pela adversidade de Judá (Versos 10-14).
3. A retribuição divina a Edom e a restauração de Israel.
A interpretação e o arranjo
cronológico de Bewer relativos a esta profecia ilustram a escola
modernista. Ele considera o livro como o produto de 4 autores
diferentes, os quais teriam vivido em tempos separados:
1. Primeiramente
foram engastadas no livro profecias de um antigo vidente, o qual vivera
antes do cativeiro e que, ao ouvir dizer que certas nações iriam se
reunir para atacar Edom, estando certo de que tal movimento provinha de
Javé, achou que essas seriam vitoriosas, predizendo, assim, a derrota de
Edom (Versos 1-4).
2.
As palavras desse vidente (o qual teria vivido em 450 a.C) foram por
Obadias adotadas, no devido tempo, quando sobreveio uma grande
catástrofe a Edom, com a invasão dos nabateus e árabes primitivos. Vendo
o seu cumprimento e recordando-se de como os edomitas haviam se
regozijado com a queda de Jerusalém em 586 a.C., o profeta deixou-se
dominar pela emoção, tendo rompido em apaixonadas admoestações, dizendo:
“Se viessem a ti ladrões, ou assaltantes de noite (como estás destruído!), não furtariam
o que lhes bastasse? Se a ti viessem os vindimadores, não deixariam
algumas uvas? ... Nem parar nas encruzilhadas, para exterminares os que
escapassem; nem entregar os que lhe restassem, no dia da angústia.
Porque o dia do SENHOR está perto, sobre todos os gentios; como tu
fizeste, assim se fará contigo; a tua recompensa voltará sobre a tua
cabeça” (Obadias 5, 14, 15).
3. Então,
talvez cem anos depois, quando os edomitas foram expulsos para Neguebe e
Judá do Sul, tendo desse modo chegado a se tornar os mais próximos
vizinhos dos judeus, continuando a se odiarem mutuamente, outro profeta
desconhecido, cheio de patriotismo, levantou sua voz e declarou que
algum dia Javé iria restaurar Israel ao seu antigo esplendor e glória
(Versos 15,16,18).
4. Finalmente,
quando se levantaram os Macabeus (168 a. C), outra pessoa fez a
conclusão do livro, e assegurou aos judeus que o reino de Javé seria
estabelecido e que somente Ele iria reinar (Versos 19-21).
Alguns outros comentaristas
apóiam a opinião de Bewer. Contudo, existem poucas razões para se pensar
que o profeta, ao predizer o futuro, estivesse realmente descrevendo o
passado, ou que falasse do que os edomitas haviam feito, como de coisas
que deveriam fazer.
IV - Data - Visto como o livro não
é introduzido com uma data histórica ou cronológica, o que permitiria
determinar a sua data, precisamos nos valer das evidências internas.
Desse modo, muitas datas divergentes têm sido sugeridas, datas que se
estendem desde o tempo de Jorão, rei de Judá (850 a.C), em cujo reinado
os filisteus e árabes atacaram Jerusalém, tendo levado os tesouros do
palácio real (2 Crônicas 21:16-17), até 312 a.C, quando os nabateus
tomaram Edom e Antígono ordenou que fosse enviada uma expedição contra
eles. Vários fatores entram na decisão deste assunto:
1. O lugar de Obadias entre os Doze -
No Hebraico ele é o quarto, seguindo esta ordem: Oséias, Joel, Amós,
Obadias, Jonas, Miquéias, etc. No Grego ele é o quinto: Oséias, Amós,
Miquéias, Joel, Obadias, Jonas, etc. Isso mostra claramente que os
organizadores do Cânon (200 a.C) consideravam Obadias como primitivo.
2. A unidade do livro -
sacrificada pelos que o colocam depois. Contudo pode ser possível o
caráter composto de um livro, mesmo tão curto, como é o caso deste.
3. O caráter vivo dos versos 10-14 – os quais parecem descrever como história a destruição de Jerusalém por Nabucodonosor, em 586 a.C. Elmslie diz: “Não
é apenas um estado arruinado, ou uma capital parcialmente saqueada que
aqui têm sido descritos, mas uma nação desmembrada, despojada e dispersa”. Claro que não se trata do juízo universal. Pusey, por exemplo, crê que estes versos são uma predição, em vez de uma descrição da
ruína de Jerusalém. Entrementes, David acha um lugar apropriado para
estes no reinado de Acaz (731 a.C), quando freqüentes calamidades
sobrevieram a Judá:
1. - Rezim, rei da Síria, livrou Elate
dos judeus, lançando-os para fora e permitindo que os edomitas ali
residissem (2 Reis 16:6 - Septuaginta).
2. - Peca, rei de Israel, matou 120 mil judeus e levou 200 mil em cativeiro (2 Crônicas 28:6-8).
3. - Zicri, homem poderoso de Efraim, matou Maasias, o filho do Rei (2 Crônicas 28:7).
4. - Os edomitas vieram a Judá e levaram presos em cativeiro (2 Crônicas 28:17).
5. - Os filisteus também invadiram várias cidades da campina e do sul de Judá (2 Crônicas 28:18).
6. Acaz tomou até os tesouros do templo, a fim de pagar tributo ao rei da Assíria (2 Reis 16:8).
Sem dúvida, condições como estas
podem muito bem explicar a descrição feita por Obadias da calamidade
de Jerusalém como “infortúnio”, “ruína” e “angústia” (Verso 12). É bem
provável, portanto, que essa profecia tenha sido feita no século 8.
V - Edom - Como já foi dito,
Obadias profetizou a respeito de Edom e mais particularmente contra a
cidade rochosa de Edom, conforme o verso 3: “A
soberba do teu coração te enganou, como o que habita nas fendas das
rochas, na sua alta morada, que diz no seu coração: Quem me derrubará em
terra?”
As rochas a que ele aqui se refere são quase na certa as de Petra, a qual, desde os tempos mais remotos, era a fortaleza central da nação. Os árabes modernos a chamam de Wady Musa. Os antigos sírios, segundo Josefo, a chamavam de Requém, por causa de Requém, o príncipe midianita que caiu numa batalha contra Israel, em Moabe, nos dias de Finéias, [quando também foi morto Balaão, o profeta filho de Beor] (Números 31:8). Pela sua situação e beleza natural, Petra é
única entre todas as outras cidades da terra. É quase impossível
descrevê-la adequadamente. Sua situação bem abaixo e em meio às
montanhas de Seir, rodeada de todos os lados por rochas coloridas, de
uma beleza e grandeza inigualáveis, fizeram de Petra uma das
maravilhas do deserto. Nela se entra por uma garganta estreita, com mais
de um quilômetro de extensão, chamada Sik ou fenda. Esse desfiladeiro é
uma das avenidas mais formosas e românticas do gênero em toda a
natureza, com um pequeno arroio ao fundo, em quase toda a sua extensão.
A garganta é estreita e profunda, sendo por vezes tão reduzida que fica
quase às escuras em pleno meio dia. As rochas que a limitam são
formosas, ostentando quase todas as cores do arco-íris. Ao sair da
mesma, em grande planície (com mais de um quilômetro de extensão por 2/3
de quilômetro de largura), o explorador se depara com moradias cortadas
na rocha, sepulcros, templos e outras escavações, por todos os lados.
Centenas destes em sua maior parte são, de fato, mausoléus originais,
cortados literalmente na sólida rocha granítica. As ruínas de um
castelo, de edifícios e dos arcos de uma ponte, além de colunas, são
vistos espalhados ao fundo do sítio da cidade. As cores das rochas
aumentam imensamente o atrativo do local. A natureza tem organizado em
faixas alternadas as cores mais belas, tais como o roxo, púrpura,
alaranjado, amarelo, branco, lilás e outras cores, as quais se matizam
artisticamente entre si, fazendo ondulações com esplendorosas e
fantásticas figuras causadas pela filtração dos óxidos e ferro, manganês
e outras substâncias, as quais, com freqüência produzem nos granitos
variedades de cores e uma formosura especial. A cidade inteira e seus
arredores formam um imenso labirinto de montanhas e rochas, escavações,
gargantas e vales estreitos, planícies e mesas, pequenos vales
sombreados e alegres promontórios, tudo muito grandioso e belo. Aqui se
tem justamente um ideal de beleza e proteção que pode satisfazer
qualquer nômade oriental, como uma fortaleza de tráfico e comércio.
Infelizmente, reina agora uma desolação dentro e ao redor de Petra, e por todos os lados, o que tem atestado tristemente as admoestações de Obadias.
VI - Ensinos - Não seria de esperar que um livro tão curto pudesse ensinar tantas lições de enorme valor. Podemos mencionar três:
1. A admoestação do profeta contra o escárnio
(verso 12) - O escárnio se origina no orgulho. Quando zombamos dos
outros, revelamos o espírito orgulhoso que existe em nós. O escárnio
revela falta de amor fraternal e com freqüência pode evidenciar um
verdadeiro ódio. Edom e Israel se menosprezavam e odiavam mutuamente em
toda a sua história. Durante vários séculos a inimizade entre ambos foi
implacável. Sempre se guerreavam por vingança. Na maior parte isso
provinha de um patriotismo egoísta e de ciúmes tribais. Para muitos o
patriotismo não passa de egoísmo nacional, o qual facilmente degenera em
arrogância. Segundo Tolstoi, “O patriotismo é um vício e pertence ao período das tribos”.
2. Sua doutrina da estrita retribuição -
(Versos 10-15) - Obadias ensinou com ênfase especial o caráter
indestrutível do juízo eterno. O “Dia do Senhor”, disse ele, virá sobre
Edom: “Porventura não
acontecerá naquele dia, diz o SENHOR, que farei perecer os sábios de
Edom, e o entendimento do monte de Esaú? E os teus poderosos, ó Temã,
estarão atemorizados, para que do monte de Esaú seja cada um exterminado
pela matança” (Versos 8 e 9). E “Por
causa da violência feita a teu irmão Jacó, cobrir-te-á a confusão, e
serás exterminado para sempre ... Porque o dia do SENHOR está perto,
sobre todos os gentios; como tu fizeste, assim se fará contigo; a tua
recompensa voltará sobre a tua cabeça” (Versos 10,15).
3. Sua segura esperança de que há de chegar uma Era de Ouro para Israel: “Mas no monte Sião haverá livramento, e ele será santo; e os da casa de Jacó possuirão as suas herdades” (Verso 17).
Finalmente lemos no verso 21: “E subirão salvadores ao monte Sião, para julgarem o monte de Esaú; e o reino será do SENHOR”.
Edom subjugada seria uma Edom incorporada. Essa promessa constitui o
lado brilhante do “Dia do Senhor”, assinalando toda a consumação da
história da humanidade. Aqui o profeta estende suas predições originais
de catástrofe sobre Edom, incluindo escatologicamente “um juízo universal sobre todos os pagãos e a conseqüente restauração de Israel”.
Esta é a palavra final, não só de Obadias, mas de toda a profecia
bíblica. É realmente um vislumbre do reino messiânico, pelo qual
ansiavam todos os profetas [E também todos os judeus ortodoxos e os cristãos verdadeiros],
sendo também uma interpretação da consciência de Israel. Nos dias
atuais as palavras do profeta estão tendo um cumprimento lento e
silencioso e em breve, conforme Apocalipse 11:15: “E
... houve no céu grandes vozes, que diziam: Os reinos do mundo vieram a
ser de nosso SENHOR e do seu Cristo, e ele reinará para todo o sempre”. [Ora, vem Senhor Jesus!”]
“The Tweve Minor Prophets”, George L. Robinson
Publicado por George H. Doran Co, New York, 1926
Traduzido por Mary Schultze, março/abril 2004
Citações bíblicas da Bíblia Revisada FIEL de Almeida
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